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A mostrar mensagens de 2023

Fios de cobre

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  Pintura de: Ana Maria Oliveira A durabilidade do metal contrasta com a transitoriedade Das células biológicas e dos amores fictícios A resistência ao desgaste anuncia-me a coragem Conservando-me intangível no aprumo Sobrevivendo às neuropatias alheias   A flexibilidade permite o enrolamento dos fios Como a minha respiração sopra as mágoas Em direções longínquas emudecendo os cânticos De braços e abraços gélidos onde a empatia se esfumou Perante a crueza dos arrombamentos de espaços cálidos   Maleável no compasso do ritual dos planetas Os dedos enrolam o fio convidando-o a entrar noutras estruturas Mas o metal é rebelde e recusa a submissão Então transforma-se o fio de cobre em arlequim Forjando lâminas e bastões entrelaçando o caos   Manobrável e engenhoso sujeita-se ao corte E ao desdobramento que conduz energias em ebulição Então dócil desmaia com a minha loucura Enroscando-se criativamente tal como a alma que me anima Neste mundo de múlt

Veneno

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  Foto: Ana Maria Oliveira Defeca o ditador nas costas do escravo Evacua o reptil arquitetando a matança Cuspe o sabujo convencido que é gente Degolam-se os algozes transformando o ódio em herança   O lacrau expele o veneno ensaiando a dança O imperador ostraciza convencendo-se que é um deus Escarra sobre a flor que ilumina o caminho Expulsa os mendigos para o submundo embelezando a superfície Executa crucificações aplaudindo divertido com trajes de arminho   A vomição ambiciona despachar a dor que se agarra ao coração Expele mensagens de adeus chutando antipatias patológicas Abraça movimentos espasmódicos que anunciam a partida De energias sobreviventes a piruetas morfológicas Num teatro de faz de conta onde se mutila quem oferece afagos Soltando-se ansiosa das correntes antropofágicas   Despeja-se na valeta a dedicação e empenho Afasta-se o ser escorraçado e mal-amado em êxodo Relega-se de forma indiferente e egoísta Proscreve-se o que nã

Canibalismo galáctico

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  Foto: Ana Maria Oliveira   Sinto que percorro uma garganta apertada que me estrangula A pequenez que me assiste não impede a deglutição do colossal Fragmento-me dentro do processo de digestão lenta Debato-me procurando salvaguardar-me na distância Protegendo o corpo e alma do predador evitando ser devorada   O gigante ignora a sua brutalidade E a capacidade de distorcer o outro Suga-lhe as entranhas Derruba-lhe a personalidade Castra-lhe a criatividade Silencia-lhe o grito Dá-lhe a bofetada final Regurgitando o ego Festejando a provocação da perda de identidade   Sobrevoando outros espaços evitando a colisão Sobrevoo o buraco negro a distância segura Pois a gravidade envolve-me e prende-me na rota de impacto Não querendo tornar-me matéria amorfa opto pela cisão Em campo movediço de fungos invisíveis que sustentam abrasões Perante a inércia do bando fujo do cadafalso Onde germinam atentados à dignidade cobertos de corrosões  

Hibernação

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  Foto: Ana Maria Oliveira Há um corpo que me acompanha na projeção dos soluços Se enrosca nos dedos ansiosos de vida crepitante Percorrendo inquieto os compartimentos da casa Uma sensação enganadora de calor ao som da música dançante Como pássaro absorto e encurralado a quem falta uma asa   O letargo busca a quentura de um velho cobertor A modorra provoca a hipnose dos mundos paralelos Na iminência hibernal em carência de sustento Enfrentando o envolvente adverso e espinhoso Intervalando o despertar em pranto e abatimento O frio de novembro congela as mãos acariciadoras de visões A temperatura interna abrevia o desejo das torrentes E quebra a pulsação desenhada num quadro romântico do pôr do sol A míngua da pressão arterial prepara o ocaso em alheamento Quando a decrescença do metabolismo acende por dentro um farol

O chão alagado das memórias

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  Foto: Ana Maria Oliveira   A chuva mergulha no chão alagado das memórias Persistentes na concretização de janelas virtuais E o arrumo provisório dos pátios transformado em bálsamo Cria salpicos de forja diretos ao coração Desarmado perante o vazio construído no tálamo   Na anulação asfixiante e vertiginosa dos sentidos Agarro os terramotos que me conduzem aos latidos dos cães Às galerias subterrâneas das minhocas À sucata desorganizada dos quintais Improvisados nos cornos gelados da necessidade Às artroses ocultas no delírio dos sonhos inalcançáveis Às unhas quebradiças do desleixo Abraço apenas o indiferente eremita desligado da sociedade Infetada pelo ódio e separação em adiamento do beijo   Restam os alfinetes que sustêm os cortinados carunchosos Adiando as limpezas bordadas de entusiasmo O pânico abafa-se na sobreposição das pinturas Desregradas pela revolta persistente sem alegria Do ser vivo aguardando a passagem ao pó em agonia   N

A nudez do desalento

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  Foto: Ana Maria Oliveira A autoilusão extravasa no prato vazio do amor A vitalidade deambula pela noite cega Regressa ao refúgio o bando de rolas Sobrevoa com avidez o galinheiro improvisado Decompondo fictícias e sobrepostas posturas   Os girassóis deixam-se comer pelos vermes Que trocam a volta ao tempo e sobem até às folhas Esburacadas lentamente pela fome Acasalam vegetal e animal na face inexpressiva da paralisia Perante a automatização dos gestos de indiferença das pessoas   Os catos persistem em não dar flor No encadeamento da tempestade Devoradora dos órgãos de sobrevivência Deixando os oxímetros avariados Perante arritmias desfeitas em abstinência

Famintas palavras

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  Foto: Ana Maria Oliveira As palavras devoraram-me os ossos Inverteram o propósito em trajetos adulterinos E conduziram os passos ao cruzamento da incerteza Ao cântico efémero dos pássaros Ao trajeto asmático dos felinos   Enlaçando agora frequências de clarividência Não há pressa na manipulação das cores até de madrugada Aconchego-me na criatividade do imperativo presente Que esqueceu as perspetivas tacanhas da sintática E avanço para sonoridades provocadoras De mandalas em delírio bailador Abandono as tintas sobre a velha tela enfadonha De uma cegueira programadora e tóxica Em ritmo caótico trémulo avassalador   Destruo a pintura varrendo pinceladas à toa E liberto-as para entrarem no jogo lúdico Do sol e da areia do rio e da veia Do vento e da poeira da montanha e planalto Do fogo e da cinza do sol e da lava Que sejam os elementos a criarem o asfalto   Alívio é a nave que me transporta de novo ao porto Que me acarinha e envolve Me d

Chove dentro de casa

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  Foto: Ana Maria Oliveira As rajadas trespassam o telhado Irrompendo no espaço humilde entre paredes Deste modo acordo impregnada de um sonho mensageiro Com a ânsia de traçar outros mapas que um deus austero plantou Ultrapassar topografias íngremes de gelo e de silêncio Reprimido na garganta que outrora cantou   As cordas vocais assimétricas geram rouquidão intermitente Delineando o cântico à vida afago em desespero As gotas de suor escorrendo pelo rosto em lassidão Encontrando paz temporária no isolamento em parte incerta Embrulhada no cobertor aquecido de mansidão   Os desejos evaporaram-se no amplexo da serenidade Assim vou acabando com a paródia das falas mansas Que escondem ambições que não têm o meu nome Nem permanecem em sintonia com o meu ser em convalescença Pois a desatenção permanece retida nos medos e vícios De abalroados gestos de rejeição e indiferença

Devorar a existência

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  Foto: Ana Maria Oliveira As bocas sedentas das fossas abissais engolem as correntes marinhas Provocando abrasões que trituram esculturas subterrâneas Do mundo esfaimado da escuridão Diante de atmosferas absorventes de venenos radioativos Tombando na superfície terrestre em excedente ablação   Paralelamente a serpente do mundo friável Consome o mineral e vomita-o em forma de sumptuosidade Torna-se cinzeladora das reentrâncias das trevas O magma engole o tempo intermitente dos raquíticos E negociantes de teatralidades despidas de tonalidade   Os devoradores verdugos procuram tesouros Escavam o âmago sugando uma viagem sem regresso Perante estampidos de cristais que se afeiçoam A terramotos indiferentes ao sentir humano imaturo E na antecipação absurda da posse de riquezas Destrói-se o presente na projeção tresloucada do futuro  

A contaminação das sementes

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    Foto: Ana Maria Oliveira Acomoda-se o filão entre o sedentarismo da crueza Ambicionando o lodo cimentado pelo terror da falha As sementes contaminadas rasgam-se para a luz Prendem-se ao vento e transpõem a muralha   Vacila a estrutura no sustentáculo das amarras Desfaz-se a dureza na cintilação das fraturas Apodrecidas pela azáfama da erosão Os ácidos consomem os tecidos circundantes Da criatura em agonizante transmutação   A fêmea geme de dor amaldiçoando o ventre   Arremessa tentáculos coadjuvando o logro Sobressaindo na clivagem do pavoneio Tece mensagens de socorro direcionando o sol E estoura em tentativa última de gesto altaneiro  

Não sei escrever o amor

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    Foto: Ana Maria Oliveira Somos criadores de conteúdos suspensos no algar Entre margens moventes que ladeiam o rio empedrado Da inveja e do ódio   Escuto os sons de um corpo que escachoa Alongando-se nas dimensões plurais Saltando brechas esqueléticas Deslizando por ravinas flutuantes Onde dançam borboletas   Agora estraçalho-me em tiras elásticas Para chegar aos lugares do encanto cristalino Das águas deslizantes pelas concavidades Do ventre da terra mãe em estonteante espiral Que acalenta as depressões da memória cega Das partículas destrutivas do contágio viral   Não sei escrever o amor Nem carregar com ele montanha acima O absurdo amoroso é uma trepadeira florida Que contamina a perspetiva tacanha De quem sustem o vómito perante afasias Para não estragar a toalha rendada Dos criadores de fantasias   Enfrentar os malabaristas ou entrar no jogo É que a queda tem dia e hora marcados E é cansativo trocar as voltas nos carreir

Sombra

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  Foto: Ana Maria Oliveira Com a tua ausência sobreveio um tempo conturbado Por tempestade magnética provocadora de compressões doridas O sol outrora convidativo envia dardos que desfazem corpos Transformando-os em vapores poluentes anulando o folgo Anunciadores de cidades subterrâneas fugindo ao fogo   A sombra é o refúgio perfeito para repousar a cabeça Impedindo que plane noutras dimensões Em esgotamento de agonia num acordar estranho Pois massas acéfalas desgastam o resto dos meus dias em desfalque Pelas arquiteturas de arte trágica em que os escravos do sonho Denunciam os horrores do compasso adulterado das relações Enquanto na gamela da fome fervilham o contágio e o decalque   A despedida impregna-se nas células do corpo O choro convulsivo acolhe a flecha certeira contra o coração A renovação constrói-se a cada passo A luminescência segrega os últimos restos de energia Num corpo em contínua desidratação E o bafo que asfixia cria aneurismas

Palavras

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  Foto: Ana Maria Oliveira   Germina uma dança lenta entre jogos de escondidas Perdeu-se algures a cabra-cega e os significados voaram Para dentro das máquinas eletrónicas geradores de fantasias Captadoras de atenção anulando genuínas companhias   Pesadelos laceram a noite como um ciclo de traumas Pressinto a rutura à espreita e uma avalanche de pedregulhos Ameaçadora da lucidez é a pérfida sinusite cruel estonteante Como rinite persistente em luta anulando o oxigénio Germinando um ressoar infindo produzindo a modorra limitante   O pensamento perde-se nos labirintos da mente atafulhada Em arame farpado ferindo ideias de salvação A expressão dilui-se na inflamação da garganta obstruída A declaração inexistente come-se gelada Declaro guerra a alianças burocráticas Rasgo contratos que minam a minha alma O grito rompe sem pejo os tímpanos E o silêncio provoca espasmos sacudindo a calma   As sílabas carcomidas expelem estruturas balançantes De p

Sem frutos

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  Foto: Ana Maria Oliveira Hoje ficarei por aqui onde os pilares foram improvisados Com a vontade em erguer um lar de sonhos Quando adivinhava a catástrofe Mas sem saber o nome da impotência Nem a cor da solidão   A serenidade faz-me companhia Pois despejei para longe as fragilidades pinceladas de negro As mãos apenas salpicarão a ouro e azul os projetos rasgados Os estudos ambicionados e não concretizados   Trago ainda tatuada na testa a definição de dadora de humanidade Ajudanta de campo a tempo inteiro Jardineira desesperada sem frutos Empregada das limpezas num mar egoísta de imensidão cega   Facilitadora da vida alheia em esquecimento da própria Dar! É o nome do tapete debaixo dos meus pés que me orienta Mas que me esgota molesta esvai-me a alma   Aproximarei as estrelas flutuantes das telas imprecisas Não saberei pintar a dança e os sorrisos com que se balançam Perante a melodia sincopada da gravidade num rasgo imensurável     O bor

As palavras não ditas

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  Foto: Ana Maria Oliveira   Germina uma dança lenta entre jogos de escondidas Perdeu-se algures a cabra-cega e os significados voaram Para dentro das máquinas eletrónicas geradores de fantasias Captadoras de atenção anulando verdadeiras companhias   As sílabas carcomidas vomitam estruturas balançantes De projetos artimanhas e adiamentos de viagens Para renovados pousos melodias e chilreados As consoantes trocadas e as vogais inquietas Tateiam um chão minado de teatros esburacados     Pesadelos laceram a noite como um ciclo de traumas O corte à espreita e uma avalanche de pedregulhos Ameaçadora da lucidez é a pérfida sinusite estonteante Como a rinite persistente em luta anulando o oxigénio Germinando um ressoar infindo gerando a modorra limitante   O pensamento perde-se nos labirintos da mente atafulhada Em arame farpado ferindo ideias de salvação A expressão dilui-se na inflamação da garganta obstruída A declaração inexistente come-se gelad