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A rua

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  Foto: Ana Maria Oliveira Outrora terra batida cercada por olivais e searas Foi projeto de aconchego a famílias de aldeias Onde a míngua era o pão nosso de cada dia e as carícias raras Esperançados nas promessas da grande cidade Investiram os últimos tostões e apostaram no desconhecido Este é o caminho daquele que rompe com a miséria impondo a vontade A classe operária no seu ritual robótico vingou O pesadelo da fome ao lado passou contornando as censuras Apesar de um governo débil e medíocre que maltrata Finalmente um teto sobreveio ultrapassando agruras   A criançada para a rua se alvoraçou e juntou Traquinices e risotas corridas e aventuras Foi tempo de construção Agora a rua tem no chão tijolos de betão Irregular aos altos e baixos sem planeamento Ao sabor de tempestades e do vento Da sorte florida impregnada de determinação Os construtores da rua de velhice faleceram Os seus filhos outras vidas tiveram Vícios sonhos desastres medos pandem

Esgar irreconhecível

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    Foto: Ana Maria Oliveira O pensamento ultrapassa a velocidade da luz Num empurrão regresso ao gelo esmagada pelo rochedo A solução para os problemas retarda e tarda o envolver bucólico Arrasto-me na sequência dos poços de tempo nebuloso O coração mapeia lugares balançantes e topografias instáveis Equilibra-se na penumbra enfastiado com tanta luz artificial Com os ouvidos em combustão invadidos pelo ruído diabólico     As telas inacabadas refletem a dança hipnótica do universo O algoritmo do reconhecimento facial permanece no passado A forma automática de reagir vomita um esgar irreconhecível Na cinematografia do esquecimento e dos cenários possíveis Num código binário que não apreende os floreados nem o sopro Nem o cloreto de sódio escorrendo do olhar Sujeito-me aos comandos de repetição e variáveis irreversíveis     Absorvo radiações compactas de risos e sorrisos sem nexo  As mãos adquirem agora garras postiças Desfazendo a carne evapora

O palco da indiferença

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  Foto: Ana Maria Oliveira Cá estou outra vez cativa deste jogo de marionetas sorridentes  Na mesma hora abandonando o pensamento na enxurrada do tempo No mesmo local aprisionando o corpo em arquiteturas efémeras Ativando no interior do ser reflexos que se emaranham Que dançam esperneiam incomodam assustam lacerando quimeras   Mas a calmaria faz pacto com as profundezas em alvoroço Do edifício humano que me envolve e sustém Os passos de outrora fortalecem a caminhada de agora As lágrimas do pretérito enxugam as gotas suspensas de penhascos Que os meus braços feitos asas irão ultrapassar na aurora   As agruras de ontem alavancam o erguer da cabeça E provocam o corpo na orientação da vida e das estrelas Rodopiando num ritual cerimonioso no presente sagrado Por veredas que se destacam por arribas e praias eternamente belas   As contusões transformaram-se no fortalecimento dos músculos  Na vontade imperativa de respirar e prosseguir  Para lá do aparent

Fronteiras em delírio

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  Foto; Ana Maria Oliveira Germina o terror nas embarcações flutuantes Ao serviço dos egocêntricos e gananciosos Açambarcadores de humanos famintos pela noite calada Prepara-se a contenda no improviso das lágrimas No desacerto dos ponteiros do relógio Que permanece apontando a carnificina sofisticada   A tensão rompe fronteiras em delírio Onde as crianças desaparecem na convergência da paranoia Os danos colaterais são assinalados a frio De forma robótica e precisa sem alarido Como uma criatura nascida para obedecer e sem apego Programada para realizar a cisão necessária À implementação do poderio empedernido   Somos assolados pelo deslize dos corpos em decomposição Empurrados pela derrapagem das viaturas sem freio Pontapeados pela tempestade que sobrevém ao inferno do fogo Surge então um batimento cardíaco rasgado pelo furacão cego Esbarrando com a ausência de empatia de seres medonhos Potências macabras que enlouquecem esquartejando Derrubando

Mendigar atenção

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  Foto de Ana Maria Oliveira Por entre a agitação bailarina e feroz da fauna A gaivota encena a coreografia anunciadora de borrasca no mar Adapta-se a ave oportunista à imundície das lixeiras E ao desperdício excedente dos humanos Alheados do cataclismo que tudo devora e alteia barreiras   O ser pedestre desperdiça  inteligência e criatividade Agindo como máquina programada ao serviço do poder Campeões do engano enlaçam malabaristas da ilusão Gigantes na mente enganosa sofrendo de pequenez São pedintes descarados de atenção Surgem como bestas salteadoras e inquietas em pura estupidez   Prolifera a manipulação de massas abastadas e cegas Devoradoras de materiais de consumo que viciam A fragilidade oculta-se atrás dos écrans da era digital Que afaga e degola o pedinte emocional Seguem a nave da instabilidade que reúne milhões no culto ao ego Explodem comportamentos patológicos Ínfimos e paranoicos na ascensão efémera a deuses do virtual   A intoxic

Paraísos fictícios

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  Foto: Ana Maria Oliveira A respiração escaldante anuncia arquiteturas desoladas Criadas nos terramotos cegos do desassossego que enlouquece A náusea invade os sentidos derrubando o alento Tal é a velocidade estonteante que o cérebro tece   Excluo o marasmo dos vendedores de paraísos Permaneço num campo de múltiplas portas e janelas Por onde esvoaço pedalo ando vomito em logradouros É a infinda selva dentro de mim em exaltação Que se expande sem grilhões nem muros   Quando a mente ultrapassa o alcance de múltiplos paralelos Descubro incansável novas vias de circulação E nesta inquietude desértica surge um ponto de orvalho Propício à plantação de telas camaleónicas Pintadas por criaturas circenses opinando sobre cosmovisão   O nível de oxigénio desce conforme as bocas dos famintos Devoram em estado selvagem a massa de vida Embrenhando-se na virgindade dos ecossistemas Sugando o ventre da terra aliciando seres robóticos A absorver veneno em lu

Estupefação

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  Foto: Ana Maria Oliveira   Esfuma-se a proteção fictícia na pedalada destravada do caos Só os esboços medíocres sobressaem na cobardia pintada de fama E na tentativa traída de purificação da atmosfera que respiro Surgem pirilampos enlouquecidos na trajetória do delírio Envolvendo um narciso que se deleita consigo próprio e a ninguém ama   A navegação no inconstante e desequilibrado gera exaustão No matagal sem nome esconde-se o apavorado recluso Mesmo entre vegetação ambiciosa provocadora de aludes Penedos soltos e incontroláveis deslizam coléricos pela serra E o meu pensamento rodopia neste envolvente perigoso Tentando alcançar estados gravitacionais de repouso   Um corpo estranho entorpecido escorre pelo rio de lava Envolvido na rede corta os nós e traça novas metas As reflexões detonam entre estrelas insubmissas E asas inventadas voam sobre alomorfias inquietas   Moldo substâncias fluidas e dormentes qual escultor Que encontra no babelesco dos